Patrimônio ambiental e arqueológico de Minas, serra da Moeda sofre com incêndios causados pela seca prolongada, despejo de lixo e entulhos e pela falta de fiscalização do poder público
Pouso Moedinha, Vegetação rasteira foi destruída pelo fogo nos últimos dias. Conjunto da serra tem patrimônio natural único no mundo, com campos rupestres
A combinação explosiva de tempo seco, montanhas de lixo e falta de fiscalização transformam a Serra da Moeda em um paiol de pólvora. Até ontem, segundo a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), foram destruídos de dois hectares de matas e vegetação rasteira, em unidade de conservação sob administração do Instituto Estadual de Florestas (IEF), e 105 hectares no entorno no maciço, que inclui Nova Lima e Brumadinho (Grande BH), Belo Vale, Moeda, Congonhas, Ouro Preto e Itabirito. As primeiras labaredas começaram há cinco dias, ameaçando um patrimônio natural único no mundo (campos rupestres sobre canga de minério) e arqueológico, além da população que vive em condomínios, sítios, chalés e outras propriedades.
De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Minas é o segundo estado com maior número de focos de calor, no país, este ano, totalizando 3.917. O primeiro é Mato Grosso, com 5.887. No país, houve 39.698. A maior parte dos incêndios, no território mineiro, tem origem criminosa pela ação de piromaníacos, que soltam fogos de artifício, ou de queima irregular em terrenos. No caso da Serra da Moeda, onde a situação estava sob controle ontem, a razão mais provável do fogo pode estar na renovação de pastagens para o gado, informa a subsecretária de Controle e Fiscalização Ambiental Integrada da Semad, Marília Melo.
Ela explica que algumas medidas serão adotadas para melhorar a segurança. Na sexta-feira, representantes de órgãos ambientais e de condomínios decidiram pela formação de grupos de vigilância. O objetivo é de que as equipes atuem na prevenção, evitando de incêndios criminosos. Para os ambientalistas da organização nãogovernamental Arca AmaSerra (Associação de Recuperação e Conservação Ambiental), a serra exige medidas urgentes. “Falta fiscalização das áreas que se transformam em bota-foras, maior número de brigadas de incêndio e programas de educação ambiental”, alerta a presidente da ONG, Simone Bottrel.
Ambientalistas Simone e Evelyn denunciam ameaças à serra por objetos que podem pegar fogo, especulação imobiliária e mineração
Na tarde dessa segunda-feira, na companhia da educadora ambiental Evelyn Zajdewerg, da Arca, Simone mostrou onde nasce o perigo. Perto do Bairro Jardim Canadá, em Nova Lima, numa das áreas da Serra da Calçada, que integra a Moeda e está em tombamento provisório pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha/MG), há montes de entulho que pegaram fogo. São despejos de construção civil, sacos de lixo, calçados, objetos de plástico e até revistas pornográficas. “A situação é delicada, pois há muitas nascentes. E tudo está bem perto da BR-040. É uma área de grande especulação imobiliária, mineração”, diz Evelyn, moradora do condomínio Retiro das Pedras.
Em nota, a Prefeitura de Nova Lima informou que retira sistematicamente entulhos e faz fiscalização no Bairro Jardim Canadá e região. Para coibir o despejo de entulhos em lotes públicos e privados, na maior parte proveniente de outras cidades, a administração municipal aumentou a inspeção no Vale do Sol, Jardim Canadá e outros bairros. “Além disso, há menos de 90 dias, foram retirados mais de 120 caminhões de entulho do Jardim Canadá. Também está em andamento, desde maio, um plano de ação de fiscalização em parceria com a polícias Militar, Rodoviária Federal e de Meio Ambiente”, informam os assessores. Denúncias podem ser feitas pelos telefones (31) 3541-8830, 3541-2677 e 3541-4377.
Sempre alertas
Simone diz que a cada ano o quadro se deteriora. “Ficamos vigilantes o tempo todo, pois toda hora está ocorrendo um incêndio. Uma ponta de cigarro pode detonar todo o processo. Tem gente que faz uma fogueirinha e as chamas se propagam rapidamente. Além disso, há o turismo predatório, que complica ainda mais”, diz a dirigente da ONG, lembrando que, na serra, há 18 minas de extração de minério e representa o divisor de águas entre as bacias dos rios Paraopeba e Velhas.
Parte da Área de Preservação Ambiental (APA) Sul, a Serra da Moeda inclui o Parque Estadual do Rola-Moça e foi declarada Monumento Natural, unidade de conservação de proteção integral, pelo Decreto Estadual 45.472, de 21/9/2010, a partir de acordo judicial firmado entre o Ministério Público Estadual e outros. O geógrafo Glauco Cezar Borges, da ONG Instituto de Estudos Pró-Cidadania (Pro-Città), destaca a necessidade de conservação da área, que abriga ruínas do século 18, como o forte de Brumadinho e a casa de fundição clandestina, em Moeda. (Colaborou Valquíria Lopes
Enquanto isso quase três meses sem chuva
BH está há 82 dias sem chuva, com temperatura na faixa de 28 graus. Nas duas últimas semanas, a média da umidade relativa do ar gira em torno de 20% – nível muito baixo, tendo em vista que o deserto registra 12%. A estiagem vai se prolongar até o início de outubro, quando deverão chegar as primeiras águas, prevê o meteorologista Ruibran dos Reis, do Instituto MinasTempo. Mesmo sem chuva, a umidade deverá aumentar a partir de quinta-feira, devido à chegada ao estado de uma frente fria que está sobre o Atlântico. No Parque Nacional da Serra do Cipó, a 100 quilômetros de BH, 40, um helicóptero, bombeiros e brigadistas tentam apagar o incêndio que atinge a reserva desde quinta-feira. Hoje deverão chegar mais 15 pessoas para trabalhar na operação.